Sola Scriptura é uma expressão latina que significa “somente as Escrituras”. Nos dias da Reforma foi a síntese de tudo o que eles defendiam. Muitos evangélicos hoje se unem em torno de slogans que defendem o “Somente as Escrituras”. Mas será que o “Somente Escritura” de nossos dias é o mesmo defendido pelos Reformadores?
O Rev. Timothy Word diz: “Quando essa expressão é definida por seus defensores e adversários contemporâneos, a doutrina que se tem em vista é muitas vezes distinta daquela encontrada nos escritos de Lutero, Calvino e outros autores protestantes dos séculos passados”.
1.- Diante deste quadro precisamos nos perguntar e investigar, em primeiro lugar, o que os reformadores NÃO tinham em mente quando diziam “Sola Scriptura”.
a) Que cada pessoa é livre para interpretar as Escrituras conforme entendeu, e,
b) Que a tradição da Igreja não é importante.
“Somente Escritura” não significa que agora podemos interpretar a Bíblia de qualquer forma, ignorando todas as interpretações dos mestres que o próprio Cristo concedeu como dom à Igreja para sua edificação ao longo da história. Os reformadores não desprezaram a tradição da Igreja que se submete aos ensinos das Escrituras. Isto é uma contradição? Não! não é. Porque a Bíblia nos diz que Deus chama homens para explicarem e aplicarem Sua Palavra escrita. Barnabé, Simeão, por sobrenome Níger, Lúcio de Cirene, Manaém e Saulo foram chamados de “mestres” na igreja de Antioquia (At 13.1); Em Efésios 4.11, Paulo disse que Cristo “concedeu uns para... mestres”. Também sabemos, com base em 1 Timóteo 3.2, que os presbíteros da igreja têm de ser aptos para ensinar. Portanto, mestres humanos é a vontade de Deus para o seu povo. Muitos mestres iluminados pelo Espírito de Deus resolveram escrever “seus” ensinos extraídos das Escrituras. Portanto, negar os credos, Confissões e Catecismos, livros e comentários fiéis as Escrituras, é negar a necessidade e importância da pregação do evangelho. Se este for o caso, cada pessoa deve ficar em sua casa, ninguém vai a nenhuma reunião cristã, ninguém evangeliza, vamos apenas ler, orar e dormir, nem devemos ensinar em nossas casas. É isto mesmo que os apóstolos, os pais da Igreja e os reformadores ensinaram? De modo nenhum.
2.- Agora, em segundo lugar, vamos considerar o que os reformadores TINHAM em mente quando diziam “Sola Scriptura”.
a) Eles tinham em mente que a autoridade das Escrituras provém de Deus, não da Igreja. Os católicos romanos têm prevalecido no erro de que o valor e a autoridade da Escritura são apenas até onde a igreja concedem. Calvino, à luz das Escrituras mostra o erro e refuta esta tolice escrevendo: “como se de fato a eterna e inviolável verdade de Deus se apoiasse no arbítrio dos homens! Pois, com grande escárnio do Espírito Santo, assim indagam os romanistas: Quem porventura nos pode fazer crer que essas coisas provieram de Deus? Quem, por acaso, nos pode atestar que elas chegaram até nossos dias inteiros e intactas? Quem, afinal, nos pode persuadir de que este livro deve ser recebido reverentemente, excluindo um outro de seu número, a não ser que a Igreja prescrevesse a norma infalível de todas essas coisas?…as Escrituras, segundo eles, depende, portanto, da determinação da Igreja. Segundo esta blasfémia, é a igreja liderada pelo papa de Roma quem determina o que é e o que não é correto. Este erro grotesco - continua Calvino - se refutam sobejamente com apenas uma palavra do Apóstolo. Categoriza ele [Ef 2.20] que a Igreja se sustém no fundamento dos profetas e dos apóstolos. Se o fundamento da Igreja é a doutrina profética e apostólica, é necessário que esta doutrina tenha sua inteira infalibilidade antes que a Igreja”. (Institutas I, p.81). Não é a igreja quem autentica as Escrituras, mas as Escrituras autentica a si mesma como Palavra autoritativa de Deus. E cremos em seu testemunho, pois ela a diz ser. O Espírito Santo que é seu autor continua falando a nós diretamente através dela. Portanto, temos razão para confiar que Deus falou nas Escrituras e continua a falar de modo claro o bastante para O conhecermos e nos salvar (cf. 2Tm 3.14 -17).
b) Eles tinham em mente “quando diziam somente as Escrituras” que a nossa regra de fé e prática é a Bíblia, pois ela é Suficiente. O que isto significa? Bem, com “regra de fé” defendiam que tudo o que devemos crer e receber, em matéria de fé, tem que seguir o padrão das Escrituras. O reformador Zwinglio conclui seus 67 artigos dizendo “que ninguém intente discutir comigo apresentando argumentos sofísticos ou aduzindo discursos humanos, senão que de antemão reconheça a Sagrada Escritura, como único juiz, a fim de que se encontre a verdade ou se mantenha em pé, como espero, e nela seja achado. Amém. Deus seja conosco!” O mesmo é para “regra de prática”. Significa que a nossa prática de vida, nosso dia a dia, deve estar de acordo com a Palavra de Deus.
Você tem vivido para a glória de Deus, o Pai? Qual é o teu maior deleite? É Cristo? Você é guiado pelo Espírito Santo? Se não, então o teu Sola Scriptura é falso. Amados irmãos, creiamos somente e acima de tudo nas Escrituras, sem, contudo, menosprezar as instruções daqueles que nos antecederam. “Trinitatis Soli Deo Gloria”.
Por: Agostinho Neves Cambele - membro da Igreja Presbiteriana de Angola; bacharelando em Teologia no Seminário Teológico Presbiteriano “Rev. José Manoel da Conceição” (Brasil).
SUGESTÕES DE LEITURA:
1- WARD, Thimoty. Teologia da Revelação. SP: Vida Nova, 2017.
2- BEEKE, Joel; et al. Sola Scriptura: Numa época sem fundamentos, o resgate do alicerce Bíblico. SP: Cultura Cristã, 2000.

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